sábado, 29 de dezembro de 2012

Vivendo num mundo virtual!

Depois de ter escrito um breve texto sobre a alimentação saudável da nossa família e a realidade que criamos para nós, chegou até mim o documentário abaixo, chamado "Criança, a alma do negócio." 


Interpretar o título já é por si só desesperador, quando percebemos que as crianças estão sendo usadas para gerar lucro, nem a menor preocupação com sua dignidade e sua condição de criança.
O consumismo desenfreado que assola a sociedade, das classes mais privilegiadas financeiramente àquelas que lutam para conseguir o pão nosso de cada dia, o consumo exacerbado assim como os produtos industrializados chegam às mesas das famílias como algo natural, em detrimento inclusive da berinjela, do chuchu, da manga e do mamão, que, como bem mostra o documentário, muitas crianças sequer conhecem.
Uma fala que me chamou muito a atenção pela verdade que contém é quando o professor do Instituto de Psicologia da USP, Yves de la Taille, fala que "as bonecas de hoje deveriam ter outro nome porque a boneca de antigamente era um trabalho de maternagem, a menina era mãe da boneca, cuidava como se fosse um filho, um bebê. Hoje em dia muitas das bonecas são projeção; você não é a mãe da Barbie, [você quer ser a Barbie."
Ele fala ainda que quando você proporciona à criança apenas uma vida irreal, fantasiosa e virtual, você não permite que a criança amadureça, pois a insere muito precocemente num ritmo adulto ao qual a criança ainda não tem estrutura para suportar.

Enquanto eu assistia ao documentário, me vieram em mente vários textos do curso de Pedagogia Waldorf, outros videos tão bons quanto este, e também algumas reflexões, como por exemplo a necessidade que alguns pais têm de deixar um bebê de um ano e meio parado em frente à televisão ou computador para ter alguns minutos de sossego.
Um dos textos que lembrei chama-se "Corrompendo o modo de brincar das crianças" de David Elkind. A leitura fala basicamente o quanto nós, adultos, estamos interferindo nas brincadeiras infantis, impedimento que as crianças desenvolvam suas próprias potencialidades e descubram o mundo através da descoberta do brincar. David fala em "assumir o controle e alterar a cultura lúdica da infância". "Brincar é o portal da criança para o conhecimento de si mesma e do mundo. Ao reinventar a experiência brincando, ela dá significado e valor à confusão estonteante da vida."A criança descobre seus potenciais e capacidades humanas ao imitar os adultos em seus afazeres. As reinvenções ampliam sua compreensão da realidade pessoal e social. 
Agora me diz, o que estamos proporcionando às crianças quando a deixamos paradas, vidradas na tela de um computador ou televisão? Estamos apenas mostrando um mundo de fantasias construídos por adultos e que, portanto, não tem significado para ela, além de estarmos produzindo a atrofia de músculos oculares que só completam seu desenvolvimento por volta dos nove anos de idade. O movimento é um impulso da criança para se desenvolver em todos os aspectos, físicos, neurológicos, emocionais e espirituais. mantê-la parada é atrasar e impedi-la de crescer com saúde.

Lembrei também de um trecho do livro "Minha querida boneca" de Karin Evelyn Scheven, com a qual tive a honra de participar de um curso de bonecas Waldorf. Ela fala do significado do consumo para uma criança. O que ensinamos à criança quando a estimulamos ou permitimos o desejo de consumo na infância? A criança passa a entender que para ser Humano é preciso consumir. Para ser aceito e afirmado como Humano é preciso ter bens. Ela fala também que as gerações passadas faziam o possível para encaminhar a geração seguinte tão preparada quanto fosse possível para a vida. Hoje, os pais confundem seus filhos e o lançam ao mundo precocemente e com um despreparo tamanho que as consequências estão sendo sentidas em todos os cantos e em muitas situações. O ser humano já não se pergunta mais "o que é ser humano".

Refletindo também sobre o conteúdo das propagandas infantis, das séries de TV, das músicas dos DVDs, pensem o quanto as crianças estão sendo levadas a um mundo de violência, de competição, de futilidades, de inverdades, um mundo superficial, sem afeto, sem contato. 
Aliás, falando em contato lembrei de um fato recente que não tem necessariamente a ver com o que estou escrevendo, mas acho que vale a pena compartilhar.
Estou acompanhando uma gestante muito querida e como é de praxe a família toda participa dos encontros, eu, Raul e Beatriz. Num encontro, após um momento relaxante de visualização do parto, fiz um simples escalda-pés com direito à massagem com óleos essenciais. Enquanto eu fazia carinho nos pés da gestante, a Beatriz, que já estava sem sandálias deste a entrada na casa, pedia massagem erguendo os pézinhos em minha direção. Mas ela não queria qualquer massagem. Tinha que ser com o óleo bem cheiroso. Peguei seus pés, um de cada vez, e comecei a massagear usando o óleo. A expressão de satisfação dela foi enorme. Permiti que ela participasse daquele momento tão bonito, inclusive com um mini escalda-pés para ela.
Bom, sem tanta conexão com o assunto de hoje, mas fiquei pensando no quanto as famílias de hoje colocam para escanteio as crianças de qualquer atividade, seja ela simples ou não. Quando limpo a casa deixo a Beatriz brincar com os panos, varrer, brincar com água, me ajudar. É essa brincadeira dela que um dia irá se tornar a compreensão de mais um papel que desempenhamos na vida em sociedade. O Raul quando faz brinquedos ou quando faz um móvel, deixa para Bea uma lixa e uma madeirinha para que ela também aprenda brincando. Hoje uma das cenas que mais vejo com crianças é o desamor (sim, desamor!, falta de cuidado e carinho!), adultos soltando palmadas ao mesmos tempo que dizem "não bata em seu amigo, não pode!". Ou saia daqui, estou arrumando a casa!" "Pare de chorar seu chato! Me deixe em paz!"
Triste. Real. Corriqueiro.

Hoje é tão comum vermos crianças viverem um mundo completamente irreal e sem significado. Crianças que não conhecem a natureza, seus sabores, suas texturas, seus cheiros. Crianças que nunca colocaram os pés na lama, que nunca brincaram na chuva, que nunca subiram em árvores! O pior é que elas estão acreditando que isso de fato não é legal, que é mais interessante jogar video game ou mexer no tablet. Elas nem sequer tem parâmetro para escolher pois as únicas coisa que são oferecidas são as coisas sem vida, sem expressão, sem sentido. Como conhecer o formato e o sabor de uma berinjela se só é oferecido lasanha congelada e nuggets? Como brincar de boneca se só são oferecidas Barbies sem o menor padrão humano? Como querer um mundo melhor se o nosso futuro está sendo corrompido pelos adultos? 
Se queremos realmente mudar alguma coisa devemos oferecer aos nossos filhos o que há de mais puro e belo no mundo! Somos nós que construímos esse mundo! Se ensinarmos as crianças que o mundo é bom, ela expandirá essa verdade e transformará o seu mundo. Se só mostrarmos o mundo de destruição de valores e riquezas naturais, ela nunca irá acreditar num mundo de paz e amor! E não é só uma questão de esperança. É uma questão de ser ativo e fazer acontecer. É levantar as armas da paz para melhorar e trazer harmonia.

Acho que a primeira tarefa que temos ao nos tornarmos mãe e pais, é buscarmos o despertar de nossa consciência, uma forma coerente e eficaz de auto-educação. A segunda, é estudarmos sobre a verdadeira infância, entendermos as etapas de desenvolvimento, e não aquelas disponíveis no BabyCenter, mas sim aqueles que falam sobre quando o cérebro do seu filho está pronto para isso ou aquilo, sobre o sono do bebê, sobre a amentação e sobre os leites artificiais, sobre os porquês de não alfabetizar precocemente, sobre os malefícios da tecnologia, enfim, conhecimento
Ser mãe e pai é entregar-se a uma jornada árdua de  mistérios e surpresas, de sorrisos, de descobertas e de muito, mas muito AMOR.

"Toda criança merece uma infância feliz!"

Deixo aqui um link de um texto excelente sobre os malefícios da tecnologia, principalmente a televisão. http://www.ime.usp.br/~vwsetzer/efeitos-negativos-meios.html

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